A
s palmas das minhas mãos
São dóceis pedras que sentem as palavras...
Deslizam em suas colinas
Suavemente e deveras rente,
Rente a cada recordação
De cada em cada dia...
Que preencheu este coração
Dócil e frágil mas cheio de poesia,
As palmas das minhas mãos
Contêm cada recordação
Como fosse uma menina que canta sem cansaço o leve embalo
Que nas colinas entoa o sereno aceno das flores.
Das manhãs e rente aos dias
Prosseguirei cultivando este coração de Poeta
Até que as mãos se unam num aplauso insonoro.
Para trás, ficou um silêncio nas palavras
Veladas em tons de papel,
Não um silêncio de lágrimas do passado
Mas um silêncio consumido noutra idade
Por detrás de amores e rancores,
Destemido e enevoado em paixões mal curadas,
Mas com tanto de saudade.
Sirius Andersen (heterónimo de Maria do Céu Costa e João Amendoeira Peixoto)
N
a translação da lua e nesse anoitecer
A deusa busca a sua perfeição
Fosse eu alguma vez a entender
No soprar das árvores a sua ilusão,
Por esse caminho no rio
Por esse soprar na frescura da noite
Não te percebo o sorriso nem o brilho
Nesse olhar que se esconde não sei aonde,
Mas é neste pleno canto
Onde rezaram antigos guerreiros
Que as recordações se desfazem num manto
Levado pelo rio em braços verdadeiros,
Pois a lua mostra sempre a mesma face
Dado que o seu período de translação
É como vejo em tudo igual
Ao período de rotação, em torno de seu eixo,
E é neste soprar do anoitecer de mais um dia
Que se acalmam num circulo perfeito
As tantas paixões nos elos da poesia
Não fosse esse teu olhar um leito.
João Amendoeira Peixoto (poema e fotografia)
Depois de arrumar algumas gavetas, encontrei alguns textos, entre os quais uma narrativa por concluir, que escrevi há cerca de três anos. Antes de voltar para a gaveta achei interessante publicar aqui, sem revelar a sua história, uma pequena parte dessa narrativa
dedicada à poesia, pertencente a uma personagem chamada Manuel, um apaixonado por poesia que procura a origem dos seus poemas.
"N
aquele dia apetecia-me escrever de tudo, no entanto não sabia bem o quê. Comecei por fazer poesia. A poesia faz-se. A poesia é algo natural, é a forma bruta dos nossos pensamentos, ela é o que eu sinto, o que eu penso, a frustração do meu pensar, a minha maneira de ser. A poesia faz parte das coisas belas, das coisas belas que o Homem faz. É uma arma do escritor, fá-lo sentir poderoso, capaz, fá-lo sentir mais do que pensa ser, fá-lo ir mais longe e descobrir o que realmente é, o que realmente consegue ser escrevendo. Depois também existe a paixão e o vício de se ser poeta, de fazer poesia. E eu sou viciado (
) Concentrei-me, desapareci. O espaço e o tempo desapareceram. Tudo ficou escuro à minha volta, e comecei a escrever. Quando se escreve, a poesia ouve-se e toca no coração. O seu som existe no pensamento, são palavras que fazem, e por vezes não fazem sentido, são sons de tranquilidade ou agitação, de águas que atravessam pedras descendo montes, é o som dos ramos das árvores que imitam a chuva, (
) é o som de tudo, daquilo que temos dentro de nós, é o som dos nossos neurónios que nos trazem recordações e permitem relacionar pensamentos. Por vezes observo o que me rodeia, observo aquela escuridão cheia de silêncio, onde vagueiam palavras perdidas, onde existem seres perdidos e imaginários, onde se fogueiam frases que rimam e não rimam. Talvez seja a própria escuridão a sua origem. (
) A porta estava aberta e a aragem fresca com sabor a flores do campo a entrar. (
) A calma, a paz e a serotonina. A serotonina faz parte de um complexo mundo, faz parte de mecanismos a nível nervoso, e a sua produção considerável faz com que nos sintamos melhor. Bateram à porta que estava aberta, era a Teresa (
)João Peixoto (texto e fotografia)
A
s árvores ardem
O céu já não é azul
A lua perdeu o brilho
As folhas perderam a cor
As estrelas perderam o trilho
Foram embora os campos em flor
Os velhos perderam as lágrimas
As crianças perderam a ilusão
Chovem cinzas sem piedade
Chovem vozes de desilusão
As chamas em tempestade,
Para onde vais Portugal
Sem o teu coração ?
João Amendoeira Peixoto
A
bre bem as asas, não te deixes cair,
Deixa-te levar por esse horizonte que te faz sorrir.
João Peixoto (poema e fotografia)
E
sboço um verde fluorescente no olhar
Que se perde em ramos de palavras
Cujas flores são algo por fazer,
Que faço e desfaço;
Que depois de polinizadas por abelhas
Reflicto,
E se transformam em frutos;
Frutos que depois são colhidos
São inspirados e sentidos
Frutos saboreados
E depois comentados.
João Peixoto (poema e fotografia) 30/07/2005