Olha para a televisão
como quem deslumbra uma flor
e sente o cheiro da paixão
envolvida de óscares e glamour,
é então…
que os seus olhos brilham só de ver
e a cheirar os panos do cinema fica acordada
madrugada fora a roer
entre dentes papaia cristalizada
na chávena o chá preto
de bochechinha animada
deslumbra Hollywood noite dentro...
noite dentro, noite dentro,
chá preto,
papaia cristalizada,
Hollywood e mais chá preto.
(para a Vera)
João Amendoeira
Diante de mim, naquelas manhãs de Inverno,
em que saía fumo pela boca,
o cabelo luzia ainda molhado,
o olhar era terno, de menina, de sorriso delicado.
As mãos eram suaves e quentes.
Dão ainda para relembrar e sentir,
os anos passaram, muitas folhas caíram por caminhos diferentes,
mas dá ainda, nas pausas da mente, para te ver sorrir.
(Outubro de 2004)
in "Apologia, João Amendoeira, Folheto Edições, 2009."
Os seus olhos azúis estavam diferentes.
O brilho menos intenso
os sentidos permaneceram distantes,
transbordava o céu imenso
no instante da despedida
em que o adeus sabe a tão pouco,
a nossa alma fica despida
a vaguear em sangue louco.
No último momento para sempre
o olhar é certo, puro e transparente.
(in "memórias de uma amiga")
João Amendoeira (c)
Havia nela qualquer coisa de diferente.
Já não sorria pela gente
já não lhe pertencia a sincronia da fala
o flamejar do brilho no olhar
a carícia que emanava para acarinhá-la
já não tropeçavam no meu aconchegar
como antigamente,
sempre amigos, crianças felizmente
felizes por sermos sem problemas
lermos contos embalados
e sonhar neles durante noites serenas.
E simples, não complicados.
E tudo se foi, pois a vida não é fácil,
E a dor nossa mártir.
João Amendoeira (c)
Naquele dia estava diferente.
Conhecia-a pelos olhos quando a mirava
havia nela um lago transparente
magoado pelos espinhos de quem amava
sem tempo, sem paz, frio vento,
sofria quando respirava.
Nunca lhe conheci o beijo
nem a voz do desejo.
João Amendoeira (c)